Recentemente, tem se visto no Brasil o aumento da popularidade de eventos de artes marciais mistas, conhecido como MMA. Apesar dos brasileiros virem se destacando e conseguido resultados expressivos na modalidade há algum tempo, apenas recentemente a mídia televisa vem dando destaque ao esporte.
Como
toda boa preparação para competições, a rotina de treino dos lutadores
de alto rendimento envolvem, além da preparação psicológica e tática,
uma preparação física extenuante, explorando diversas capacidades
físicas como força, potência, flexibilidade, capacidade aeróbia e
anaeróbia e uma preparação técnica na qual diversas artes marciais e
lutas são praticadas visando explorar técnicas das diferentes
modalidades.
Tudo isso, com a finalidade de tornar o atleta o mais completo e preparado possível para enfrentar seus oponentes.
Com
o crescimento no número de participantes e o destaque na mídia, a
modalidade se tornou mais profissional, com a criação de regras para
preservar os atletas e privilegiar o espetáculo, tornando-o mais
popular.
Parte
destas regras foram a divisão em categorias por peso como maneira de
equilibrar os combates e possibilitar que diferenças grandes de pesos
não sejam o fator decisivo para a vitória, assim como seguem outros
esportes como o boxe, judô, jiu jitsu, wresting, entre outras,.
Com
a criação das categorias de peso, alguns atletas se viram forçados a
ganhar mais peso ou mesmo perder peso para se adequar a categoria
conveniente. Não é de hoje que atletas, sobretudo de artes marciais e
lutas, têm dificuldade de manter o peso para o momento da luta.
Em
entrevistas, lutadores e seus treinadores relatam perdas em torno de 10
quilos pelos atletas poucos dias antes das lutas, assim como uma
acentuada recuperação do peso perdido apenas um dia após a pesagem.
Embora
estes valores pareçam extremamente elevados, há relatos de perdas
superiores a 20 quilos em atletas estadunidenses antes de competições.
Estas perdas são seguidas de recuperações rápidas, por meio do processo
de hidratação e alimentação fracionada.
Estas
manobras são utilizadas por mais de 80% dos atletas de competição, onde
“bater” o peso é fundamental para permanência na categoria (Steen et
al. 1990). Desta maneira visam levar vantagem sobre um adversário de
menor peso, sobretudo em determinadas situações de lutas onde um peso
maior pode ser um diferencial no combate (Steen et al. 1990).
Artioli
et al 2010, entrevistaram judocas de elite brasileiros para o
conhecimento de sua massa corporal, e as formas de rápida redução de
peso para competições. Mais de 85% dos entrevistados estavam acima do
peso no momento da entrevista sendo que 33% da amostra estavam entre 5 a
10% acima dos valores da categoria. Destes entrevistados o uso de
desidratação e ou restrições alimentares foram as estratégias escolhidas
pela maior parte dos entrevistados (Artioli et al. 2010).
Percentuais
de gordura de atletas de competição já são normalmente inferiores ao da
população em geral. A perda de peso se dá basicamente pela perda de
água, glicogênio muscular e em menor escala gordura e massa muscular.
Dentre
as inúmeras estratégias utilizadas para “enganar” a pesagem e se
conseguir esta perda de peso absurda, estão a utilização da sauna,
restrição severa de nutrientes e de líquidos, banhos em contraste, além
de uso de diuréticos, laxantes e realização de exercícios em condições
adversas como com excesso de roupas ou em locais com temperatura
elevada, entre outras. (American College of Sports Medicine, Steen et
al. 1990).
Basicamente,
o princípio é desidratar o atleta para que ele chegue ao peso desejado.
Mas os riscos desta manobra são inúmeros podendo levar desde a simples
perda de performance até a morte. (Sawka et al. 2007)
Outro
fator importante é que grande parte dos métodos que levam a perda de
peso pela desidratação envolve aumento da temperatura corporal, de forma
a acentuar a sudorese. Nosso organismo procura constantemente o estado
de equilíbrio. A temperatura corporal de um indivíduo saudável gira em
torno de 36°C a 37,5°C, em que há conservação das funções metabólicas.
Uma
das tentativas de manutenção da homeostase térmica é a vasodilatação,
com a troca de calor com o ambiente e a estimulação das glândulas
sudoríparas para produção de suor.
Quando
esta tentativa é frustrada, seja pela temperatura e a umidade relativa
do ar do ambiente estar elevada, seja pelo uso de roupas que dificultam a
troca de calor, o organismo sofre com a elevação da temperatura
interna.
Estas
elevações de temperatura levam progressivamente o organismo a perda de
rendimento, estados de confusão mental, falta de coordenação motora,
insuficiência renal aguda, rabdomiólise e colapso; em termos de
desempenho, reduz a capacidade aeróbia, diminui o tempo de instalação da
fadiga e aumenta o acúmulo de calor (Armstrong et al., 2007, Sawka et
al., 2007)
Muitas
vezes os atletas utilizam mais de uma forma de perda de peso como visto
no trabalho de Kiningham et al. (2001), onde 12% dos atletas utilizavam
até cinco métodos de perda de peso durante uma semana.
Estas
manobras são utilizadas no período de aproximadamente 7 dias antes da
luta e estes ciclos se repetem ao longo dos anos e da vida esportiva de
atletas, tendo seu início muitas vezes na infância e adolescência, o que
pode trazer riscos sérios de desenvolvimento e de problemas
psicológicos associados a alimentação. (Kiningham et al. 2001)
A
literatura é conflituosa e carente sobre a eficiência da utilização dos
ciclos de perda rápida e recuperação de peso antes das competições.
Horswill
e colaboradores em 1994 não encontraram relação positiva vantajosa em
atletas de luta olímpica sobre a recuperação do peso perdido 20 horas
antes da competição e conseqüente recuperação nem em valores absolutos e
nem em relativos, fato este corroborado com outros autores
No
entanto, alguns artigos traçaram correlações positivas entre os ciclos
rápidos de perda e recuperação do peso com o sucesso em competições.
(Alderman et al. 2004, Wroble et al. 1998).
Certo
é, que durante os processos de perda de peso acentuados, os níveis de
hidratação ficam prejudicados, assim como os estoques de glicogênio
muscular, perda de massa muscular, perda de eletrólitos, etc. Muitos
destes não recuperados para os momentos das lutas.
Relatos
de fraqueza, sonolência, cãibras, confusão mental, perda de força,
desmotivação, são comuns durante o processo de perda de peso. Já no
processo de ganho de peso, são comuns náuseas, diarréias, dores de
cabeça, e hiponatremia.
Em
um posicionamento feito em 1996, o Colégio Americano de Medicina do
Esporte já alertava e orientava os praticantes de artes marciais e lutas
dos riscos da perda de peso rápida antes de competições.
Com
relação à queda de performance, após períodos de perdas de peso
acentuadas em curto espaço de tempo, a literatura não é conclusiva em
afirmar que atletas submetidos a estas manobras tenham prejuízos na
capacidade anaeróbia e aeróbia.
A
variação estratégica para diminuição de peso, intervenções voltados
para reposição de líquidos e nutrientes, associados a diferentes tipos
de protocolos dificultam a uma definição sobre o assunto.
Independente
da perda da performance, é necessária a atenção especial de
treinadores, pais e atletas para as estratégias utilizadas para a
redução de peso, e no tempo em que esta perda estará sendo realizada.
Organizações
esportivas devem encontrar formatos para evitar que tragédias
aconteçam, instituindo regras ou avaliações constantes de seus atletas,
como por exemplo o monitoramento durante a temporada, permitindo
variações mínimas durante o período pré competitivo até o momento da
luta ou até mesmo a pesagem momentos antes da luta como forma de coibir
tais práticas.
Autor: Julio Papeschi
Fonte: GEASE
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